Com um humor cativante, o matemático Eduardo Sáenz de Cabezón responde uma questão que tem quebrado a cabeça de estudantes no mundo todo: "Pra que serve a matemática?" Ele revela a beleza da matemática como a espinha dorsal da ciência e mostra que os teoremas são eternos, e não os diamantes. Confira o vídeo na integra:





Transcrição do vídeo em Português:

Imagine que você está em um bar... Ou em uma boate. Você começa a conversar e, então, surge esta pergunta: "Com o que você trabalha?" Como acha seu trabalho interessante, responde: "Sou matemático." (Risos) Quando a conversa segue, inevitavelmente, aparece uma destas duas frases: A) "Eu era péssimo em matemática, mas não era minha culpa. O professor é que era péssimo." (Risos) B) "Mas pra que serve matemática?" (Risos) Vou tratar do Caso B. (Risos)

Quando alguém pergunta para que serve a matemática, ele não quer saber quais são as aplicações das ciências matemáticas. Ele está perguntando: "Por que tive que estudar esta droga que nunca mais usei na vida?" (Risos) É isso que está perguntando realmente. Por isto, quando os matemáticos são questionados para que serve a matemática, costumamos nos dividir em grupos: cerca de 54,51% dos matemáticos vão tomar uma posição de ataque, e 44,77% deles ficarão na defensiva. Há uma exceção de 0,8%, na qual eu me incluo.

Quem são os que atacam? São aqueles matemáticos que irão te dizer: "Esta pergunta não faz sentido, porque a matemática tem um significado próprio. É um belo edifício que se constrói com a sua lógica própria, e que não precisa que estejam sempre buscando todas as aplicações possíveis. Para que serve a poesia? Para que serve o amor? Para que serve a própria vida? Que tipo de pergunta é esta?" (Risos) Hardy, por exemplo, era um expoente deste tipo de ataque.

E os que ficam na defensiva vão dizer: "Mesmo que você não perceba, amigo, a matemática está por trás de tudo." (Risos) Estes caras sempre vão citar pontes e computadores. "Se você não sabe matemática, sua ponte vai desabar." (Risos) Realmente os computadores são matemática pura. E esses caras também vão dizer que por trás da segurança da informação e dos cartões de créditos estão os números primos. Estas são as respostas que o seu professor vai lhe dar se você perguntar. Ele é do time dos defensivos.

Tudo bem, mas quem está certo então? Os que dizem que a matemática não precisa ter um propósito, ou os que afirmam que a matemática está por trás de tudo? Na verdade, ambos estão certos. Mas lembra que eu disse que pertenço aos 0,8% que alegam outra coisa? Então vá em frente e me pergunte para que serve a matemática.

Plateia: "Pra que serve a matemática?"

Eduardo: Certo, 76,34% perguntaram para que serve, 23,41% não falaram nada e 0,8% que não sei o que está fazendo. Bem, aos meus queridos 76,34%... É verdade que a matemática não precisa servir a um propósito. Realmente ela é uma estrutura bela, lógica, provavelmente um dos maiores esforços coletivos já realizados na história da humanidade. Mas também é verdade que lá, onde cientistas e técnicos estão à procura de teorias matemáticas que os permitam avançar, está a estrutura da matemática que permeia tudo.

É verdade que devemos nos aprofundar para ver o que está por trás da ciência. A ciência funciona através da intuição, da criatividade. E a matemática controla a intuição e comanda a criatividade. Quase todo mundo que nunca ouviu isto antes se surpreende ao saber que se você pegar uma folha de papel de 0,1 milímetro de espessura, das que usamos normalmente, e se ela for grande o suficiente para ser dobrada 50 vezes, a sua espessura ocuparia a distância da Terra até o Sol. A sua intuição diz que é impossível. Faça os cálculos e verá que ela está certa. A matemática serve para isso.

É verdade que a ciência, todos os tipos de ciência, só faz sentido porque nos ajuda a entender melhor o belo mundo em que vivemos. E ao fazer isto, ela nos ajuda a escapar das armadilhas deste mundo doloroso em que vivemos. Há ciências que nos ajudam nesta direção claramente. As ciências oncológicas, por exemplo. E há outras que olhamos de longe, com inveja às vezes, mas sabendo que somos o seu suporte. Todas as ciências básicas são a base daquelas, incluindo a matemática. Tudo o que faz a ciência ser ciência é o rigor da matemática. E este rigor existe porque seus resultados são eternos.

Você já disse ou ouviu dizer, em algum momento, que um diamante é eterno, não é? Isto depende da sua definição de eterno. Um teorema, isso sim, é eterno. (Risos) O teorema de Pitágoras continua verdadeiro, eu garanto isto, apesar de Pitágoras estar morto. (Risos) Mesmo se o mundo desabasse, o teorema de Pitágoras ainda seria verdadeiro. Onde quer que um par de catetos e uma boa hipotenusa se reúnam, (Risos) o teorema de Pitágoras estará la, funcionando como um louco. (Aplausos)

Bem, nós, matemáticos, nos dedicamos a fazer teoremas, verdades eternas. Mas nem sempre é fácil saber a diferença entre uma verdade eterna, um teorema e uma simples hipótese. Você precisa de uma demonstração. Por exemplo, imagine que eu tenho aqui um campo grande, enorme, infinito. Eu quero cobri-lo com peças iguais sem deixar espaços. Eu poderia usar quadrados, não é? Eu poderia usar triângulos; círculos não, eles deixam lacunas. Qual é o melhor formato para usar? Um que cubra a mesma superfície, mas com uma borda menor. Pappus de Alexandria, no ano 300, disse que o melhor era usar hexágonos, assim como as abelhas. Mas ele não provou. O cara disse: "Hexágonos, ótimo! Vamos com hexágonos!" Ele não provou, permaneceu uma hipótese. "Hexágonos!" E o mundo, como você sabe, se dividiu entre Pappistas e anti-Pappistas, até que, 1.700 anos depois, em 1999, Thomas Hales provou que Pappus e as abelhas estavam certos: o melhor é usar hexágonos. E isto se tornou um teorema, o "teorema da colmeia", que será verdadeiro para todo o sempre. Mais que qualquer diamante que você tenha. (Risos)

Mas o que acontece se formos para a terceira dimensão? Se eu quiser preencher o espaço com peças iguais, sem deixar lacunas, eu posso usar cubos, certo? Esferas não, elas deixam espaços. (Risos) Qual é o melhor formato para usar? Lord Kelvin, do famoso "graus Kelvin" e tudo mais, disse que o melhor era usar um octaedro truncado. (Risos) Que, como todo mundo sabe... (Risos) É esta coisa aqui. (Aplausos) Qual é? Quem não tem um octaedro truncado em casa? (Risos) Mesmo de plástico. "Querida, traga o octaedro truncado, temos visitas!" Todo mundo tem. (Risos)

Mas Kelvin não provou. Permaneceu uma hipótese, a "conjectura de Kelvin". E o mundo, como você sabe, se dividiu entre Kelvinistas e anti-Kelvinistas. (Risos) Até que cento e poucos anos depois... Cento e poucos anos depois, alguém descobriu uma estrutura melhor. Weaire e Phelan... Weaire e Phelan descobriram esta coisinha aqui. (Risos) Esta estrutura, à qual deram o criativo nome de: "estrutura de Weaire-Phelan". (Risos) Parece uma coisa rara, mas não é tão rara. Também está presente na natureza. É bem curioso que esta estrutura, devido a suas propriedades geométricas, foi usada para construir o Centro Aquático para os Jogos Olímpicos de Pequim. Lá, Michael Phelps ganhou oito medalhas de ouro e se tornou o melhor nadador de todos os tempos. Bom, de todos os tempos até que apareça alguém melhor, não é? Assim como a estrutura de Weaire-Phelan é a melhor até que apareça outra melhor. Mas cuidado! Pois esta tem uma chance real, mesmo que passem cento e poucos anos, ou mesmo 1.700 anos, de alguém provar que ela é o melhor formato possível. Então ela se tornará um teorema, uma verdade para todo o sempre. Mais que qualquer diamante. Então, se você quiser dizer para alguém que o amará por toda a vida, (Risos) dê-lhe um diamante. Mas se você quiser dizer que o amará para todo o sempre, dê-lhe um teorema! (Risos) Mas espere um pouco! Você terá que provar que o seu amor não é apenas uma hipótese. (Aplausos)


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